Artigo publicado na revista Tempos Novos
Quatro
vagas de mobilizaçom democratizadora caracterizam a política do
último médio século. A primeira, que desde os sesenta vinha
qüestionando o mando franquista, obrigou a operar un cámbio de
régime que mudou a dictadura militar por umha democracia liberal
homologável às da Europa occidental. Esta operaçom de engenheria
política, conhecida como Transición española, serviu para
actualizar o mando capitalista ao tempo que continha o desafio
crecente de umha multitude de subjectividades antagonistas às que,
polo geral, identificamos como “(novos) movimientos sociais”
Umha
vez instaurado, consolidado e institucionalizado o novo régime, a
mobilizaçom social declinou. As avantages evidentes no passo de umha
ditadura militar a umha democracia liberal, ou o feche de estruturas
políticas que se seguiu após a maiorias absolutas do 82, o 86 e, de
facto, o 89; mas, sobretodo, o recrutamento massivo de quadros
políticos nos movimentos da época para fazer viável a política de
partido, mermou o impacto das duas vagas de mobilizaçom que haveriam
de seguir.
Tanto
na primeira vaga da democracia (entre mediados dos oitenta cos ciclos
contra a OTAN, a selectividade ou o 14D, por exemplo) como na
segunda, polo geral identificada polo contexto global de emergência
do altermundialismo (LOU, Prestige, Guerra de Iraq, etc-), o régime
desfrutou de umhas cómodas marges nas que levar a termo o projecto
neoliberal. Umha esquerra de partido e sindical, polo demais
funcionarizada, subvencionada e contenta com ser gestora da sua
própria derrota, apoltronou-se no régime de 1978 namentres toda
umha geraçom, simbólicamente identificável co Cojo Mantecas,
era enviada a precariedade de por vida (e nisto seguimos).
Assi
as cousas, o 15M vem marcar a rutura coa que Guillem Martínez deu en
chamar, tam atinado, Cultura de la Transición.
Após o 15M a idea de rutura constituinte foi colhendo corpo numha
sucessom de ciclos que artelhavam sinergicamente umha quarta vaga de
mobilizaçons —agora
sí—
quem de desbordar o
régime de 1978. Sem o éxito do 15M nom se entende a recta final de
Zapatero, a sua blindage do pago da déveda por meio da reforma
constitucional express pactada por PSOE e PP e, por riba de
qualesquer outra consideraçom, umha derrota autoinflingida em data
tam simbólica como o próprio 2oN.
A
maioria absoluta do PP que começa no 20N é tambem o início de umha
nova etapa de pressom crecente nas ruas e bloqueo institucional ao
amparo do Governo Rajoy. No par de anos que se seguiram os
repertórios do 15M mudam e os ciclos se sucedem: rodea-se o
Congreso, irrumpem as
mareas, estoupa o Gamonal... Dous anos de intensiva repressom e
restricçom das liberdades públicas que se concretam num
endurecimento feito a medida do PP, multas e penas de cárcere que
procuram afogar todo antagonismo, etc. Para o outono passado as
energias e o esgotamento activista faciam o movimiento moito mais
sensível e frágil às habituais acusaçons (científicamente
infundadas) de desmobilizaçom. O risco de acabar acreditando numha
profecia que se autocumprise ia em aumento e nom eram poucos quem
para esse momento se entregavam às paixons tristes (sectarismos
ideológicos, burnouts
ou “queimes” activistas, delírios insurreccionalistas, etc.).
Foi
daquela quando, no horizonte das eleiçons europeas, mais acuciou um
gesto que alterasse o guiom previsto pola própria lógica do régime.
A realizaçom dos resultados previstos daquela nas enquisas e dados
por seguros nos marcos interpretativos dos media (bipartidismo
oficial de PP e PSOE castigado polo bipartidismo de rempraço de UPyD
e IU) teria sido um revés dificilmente superável para a política
de movimiento. Nesse contexto assina-se o manifesto Mover
ficha que dá pé ao lançamento
do que se conhecerá de seguida como Podemos.
Baixo
este nome som moitas as leituras que moram num mesmo acontecimiento e
mesmo hoje, após as eleiçons europeas, vivimos um intenso debate e
pugna pola significaçom hegemónica dos resultados eleitorais, mas,
sobretodo, por caracterizar esse “objecto político nom
identificado” chamado Podemos, assi como os seus precedentes (CUP
ou Partido Pirata), coetáneos (Partido X), e secuelas (Guanyem
Barcelona). Avançamos já umha hipótese: Podemos é um gesto
antagonista de reapertura do horizonte político no que um conjunto
de notáveis (Iglesias, Monedero, Errejón, etc.) lançam umha
proposta de mobilizaçom cívica de cara às eleiçons europeas que
dé ao traste coa crónica de um resultado eleitoral anunciado.
En
efeito, o gesto Podemos trata a um tempo de experimentar coa
modalidade de agência política (qüestionando a centralidade do
partido) e favorecer novos ciclos de loitas (Can Vies, por exemplo,
já como resposta inmediata no contexto eleitoral) por meio de
alterar os equilíbrios de poder que fai possível interferir na mais
importante via de accesso formal ao régime: os comícios. Nom é
para nada casual, de feito, que ao igual que o 15M ou a Diada
do 2012, fosse na perspectiva de umha convocatória eleitoral que
irrumpiu Podemos.
Mais
ainda, tampoco se pode entender Guanyem Barcelona, a seguinte mutaçom
das interfazes do movimiento no governo representativo, sem
comprender o processo de experimentaçom conjunto que comporta o
desbordamento democrático de esta quarta vaga de mobilizaçons. No
caso do processo que se visibiliza na figura de Ada Colau assistimos
à produçom de umha interfaz mais complexa ainda, na que baixo o
significante-vector “confluência” aponta-se, de facto, à
eventual subsunçom da política de partido na política de movimento
(igual que antes a política de notável fora subsumida na política
de partido).
Quadratura
do círculo? Ainda é demasiado cedo para sabermos qual será o
resultado final. Porém, o impacto do factor Podemos no contexto
posteleitoral, provocando reajustes da envergadura da abdicaçom, a
demissom de Rubalcaba, umha eventual modificaçom da eleiçom dos
alcaldes, etc., anima a pensar —particularmente
em Catalunya e, mais ainda, na cidade de Barcelona—
que é possível dar coa forma institucional de umha interfaz à
altura das esigências de cámbio político que demandam os tempos.
Ao cabo, de esta quarta vaga de mobilizaçons, saira-se com umha
democracia reforçada ou baixo o mando reconfigurado do que noutro
tempo se chamava “democradura”. A fase expressiva do disenso
passou. Ganhar ou nom ganhar é agora a qüestom.